“Eu olhei nos olhinhos dele e só me deixei inundar por aquele amor que ele me transmitiu”

25 de maio de 2024 - 08:37 # # # #

Sheyla Castelo Branco - Ascom SPS - Texto
Arquivo Pessoal - Fotos

Um provérbio africano diz que é preciso uma aldeia inteira para educar uma criança. Nina Mayumi (40) e Filipe Loyola (34) têm vivido essa experiência após a adoção do Samuel (5), que chegou na vida deles modificando prioridades e a rotina da família. A história de Samuel é uma celebração ao Dia Nacional da Adoção, comemorado neste 25 de maio.

Nina e Filipe moram no interior de São Paulo, em Tremembé. “Passei oito anos tentando engravidar, e durante esse processo decidimos entrar no Cadastro Nacional para Adoção e Acolhimento. Assim que o nosso cadastro ficou habilitado, engravidei do Benjamin (4), e logo em seguida da Aurora (2), mas a gente decidiu seguir no cadastro, e foi assim que o Samuel chegou nas nossas vidas”, conta Nina.

Ela lembra que quando conheceram o Samuel tiveram a confirmação de que ele era filho deles. “Eu olhei nos olhinhos dele e só me deixei inundar por aquele amor que ele me transmitiu. Não precisamos de muitos encontros para entender que ele era parte da nossa família e que voltaríamos para São Paulo completamente diferentes de quando chegamos a Fortaleza”, diz a professora, que se emociona ao lembrar do primeiro encontro com Samuel.

No último dia 15 de maio, uma nova vida surgiu para a família da Nina e do Filipe. A chegada do Samuel tirou tudo do lugar costumeiro e acendeu uma chama de afeto não só no coração dos avós, dos irmãos e dos pais, mas também dos amigos da família. “Estamos fazendo várias alterações na nossa rotina e das crianças para que ele possa ter a atenção e os cuidados de que necessita. Pela manhã levo o Samuel para a escola e consigo dar mais atenção ao Benjamin e à Aurora. No período da tarde, enquanto os dois estão na escola, eu aproveito todo o tempo com o Samuel, levo para as terapias e converso muito com ele para estimular o desenvolvimento da fala. Estamos em um período de adaptações e o apoio dos meus pais e de amigos tem sido fundamental para que a gente consiga ofertar os melhores tratamentos e uma reabilitação de qualidade para o meu filho”, explica Nina.

Samuel tem paralisia cerebral e a síndrome de Klippel-Feil, também conhecida por sinostose congênita cervical, uma malformação rara, que consiste na fusão de duas ou mais vértebras cervicais. Ele consegue emitir alguns sons, mas tem a fala comprometida. Quando chegou no abrigo Tia Júlia Primeira Infância, Samuel tinha apenas um ano e quatro meses, e durante os anos que permaneceu no abrigo ele teve uma evolução considerável por conta dos cuidados dos profissionais da unidade e das idas aos médicos recomendados.

Filipe é engenheiro biomédico e trabalha com tecnologia assistiva, além de dar aulas em uma universidade. “Os cuidados com o Samuel me instigam a pensar sempre na melhor forma de auxiliar na reabilitação dele a partir do que faço no meu trabalho. Eu sou apaixonado pela minha área de atuação e saber que posso usar meus conhecimentos para auxiliar meu filho com melhorias para o seu bem estar é algo muito precioso pra mim”, conta Filipe.

Júlia Barreto é coordenadora do Abrigo Tia Júlia/Primeira infância, equipamento coordenado pela Secretaria da Proteção Social (SPS), e diz que quando o tema é adoção, são muitas histórias de amor para contar. “Recentemente tivemos o privilégio de vivenciar algumas dessas histórias, que enchem os nossos corações de alegria e esperança. Ressaltamos aqui, essencialmente, a adoção de crianças atípicas, que no senso comum, estariam fadadas a viverem num ambiente institucional, mas a força movedora do amor, de quem gesta um filho no coração, movimenta-se ao encontro dessas crianças. Um encontro de almas, ligadas por laços afetivos invisíveis aos olhos, mas perceptível no amor que transborda, e ativa uma força transformadora na vida e no destino dessas crianças”, frisa Elisa Barreto.

“Hoje, minha filha diz “eu te amo”, me abraça, pede colo”, conta Daffiner, mãe da Clara.

Assim como o Samuel (5), a Clara (6) chegou ao Tia Júlia quando ainda era um bebê, com apenas 5 meses de vida. No ano passado, ela foi para um lar cheio de amor e hoje seus pais relatam essa história de encontro e de transformação.

A massoterapeuta Daffiner Piemonte (38), mãe da Clara, conta que sempre quis adotar uma criança, mas que guardou esse desejo por um tempo, e mesmo depois dos seus dois filhos biológicos o desejo permaneceu com ela.

“Quando decidimos adotar uma criança, eu e Paulo, meu marido, ficamos na fila por sete meses, e foi através da busca ativa que encontramos a Clara. Foram vários encontros até a gente conquistar a confiança dela, que aos pouquinhos foi conhecendo a nova família. Os meus outros dois filhos, Theo e Noah, também participaram das visitas para que ela entendesse que a partir dali iria conviver com eles também”, disse Daffiner.

A Clara tem a síndrome alcoólica fetal (SAF), que é a principal causa de anomalia congênita não hereditária nos bebês, causada pelo consumo de álcool durante a gravidez. A síndrome afeta o desenvolvimento cognitivo dela e o seu crescimento, bem como algumas características físicas.

Daffiner revela que no início não foi fácil, mas com amor as coisas foram se encaixando. “Já vai fazer um ano que saímos de São Paulo e viemos pra Fortaleza conhecer a Clara. No início, ela tinha rompantes assim de quebrar a tela do meu celular, e a gente foi com calma explicando que não podia fazer aquilo, que aquilo entristecia o papai e a mamãe. Na escola, ela tinha muito medo da rejeição, achando que iríamos deixá-la lá e não voltar mais. Então, foi todo um processo de adaptação mesmo e que deu certo porque a gente se dispôs a tentar de verdade”, conta.

“Hoje, minha filha diz “eu te amo”, me abraça, pede colo, ainda tem alguns medos, mas com respeito, amor e cuidado nossa família está superando tudo”, conta a mãe da Clara.

Atualmente, no Ceará, os abrigos institucionalizados do Governo do Estado reúnem 211 crianças e adolescentes. Deste número, 24 aguardam adoção. A titular da SPS, Onélia Santana, destaca que é importante lembrar que a prioridade, antes de tudo, é restabelecer os vínculos com a família de origem, caso seja possível. Quando não há essa possibilidade, a criança e o adolescente ficam aguardando adoção.

“Neste período, dentro dos abrigos, tentamos fazer com que essa vivência deles seja humanizada. Crianças e adolescentes acolhidos ficam rodeados de cuidados e muito afeto das cuidadoras, além de receberem cuidados médicos e terem acesso a atividades diversas de arte, cultura e esporte, inclusive dentro de outros equipamentos sociais coordenados pela SPS”, reitera Onélia Santana, que ainda lembra que, do ano passado até este último mês de maio, foram adotados 19 crianças e adolescentes dos abrigos estaduais.