HIV, aids e carga viral indetectável: o que você precisa saber para viver com mais informação e menos preconceito

16 de dezembro de 2025 - 17:00 # # # #

Assessoria de Comunicação do HSJ
Texto: Allane Marreiro
Fotos: Allane Marreiro e arquivo pessoal

“O HIV nunca me parou ou me impediu de fazer algo em nenhum aspecto da minha vida. Ele é apenas uma parte de mim, mas não é o que define quem eu sou”, afirma, com convicção, Credileuda Azevedo, de 55 anos. Destes, 32 são convivendo com o HIV.

Credileuda (foto) mora no município de Horizonte e é acompanhada pelo ambulatório de HIV do Hospital São José (HSJ), unidade da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) referência em tratamento de doenças infecciosas. Para Credileuda, ser acompanhada pela equipe multiprofissional do HSJ é sinônimo de saúde e bem-estar. Ela diz, porém, que isso é só um dos aspectos da sua rotina.

“Sou filha, mãe, esposa, avó e bisavó. No momento, estou intercalando minhas atividades entre o meu trabalho voluntário na Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV/aids, no Movimento Nacional das Cidadãs PositHIVas, e em cuidar dos meus pais que já estão em idade avançada. Gosto de futebol, ir à praia e do interior, meu lugar favorito, pois me traz paz”, relata.

Por meio do acompanhamento médico e por conseguir atingir a carga viral indetectável, Credileuda pôde ser mãe, avó e bisavó de uma família saudável

Diferente de Credileuda, que nunca escondeu seu diagnóstico e fala abertamente que é uma pessoa que vive com HIV, muitos pacientes, com medo dos julgamentos, dos estigmas, da discriminação, e principalmente, do abandono, escondem seus diagnósticos. Mas a ciência avançou, os tratamentos evoluíram e hoje viver com HIV não significa viver doente. Entender a diferença entre HIV/aids e o papel da carga viral indetectável é um passo essencial para combater preconceitos e cuidar melhor da saúde.

HIV x aids

De acordo com o infectologista Érico Arruda, estar com HIV não significa ter aids, com o tratamento adequado o paciente pode nunca chegar a desenvolver aids

Segundo o médico infectologista do Hospital São José, Érico Arruda, a principal diferença entre HIV e aids é que ter HIV significa estar infectado pelo vírus da imunodeficiência humana. Já a aids é um estágio avançado dessa infecção — que só aparece quando o vírus já causou grande dano ao sistema imunológico.“Estar com HIV não significa ter aids. A aids aparece quando a pessoa acumula tanta fragilidade imunológica que passa a adoecer por condições que não teria se seu sistema imunológico estivesse saudável”, explica o especialista.

Com o tratamento disponível gratuitamente pelo Sistema Único de Saúde (SUS), a maioria das pessoas não chega a desenvolver aids, mantendo a saúde e uma vida completamente ativa, como relata Samuel [nome fictício], homem de 54 anos, que teve seu diagnóstico de HIV aos 18 anos, em 1989. “HIV não é nenhum bicho de sete cabeças e, se você cuidar, não mata. Tem tratamento, medicação e acompanhamento pelo SUS e pelos grupos de apoio. Seguindo as orientações médicas, a gente vive muito e bem. Graças ao tratamento, estou com a carga viral indetectável, me tornei forte, estudei, trabalhei, levei uma vida normal, realizei muitas coisas que quis. E hoje, continuo motivado e fazendo planos para o futuro”, afirma.

Mas, afinal, o que significa carga viral indetectável?

Talvez o termo seja um dos mais importantes quando falamos de HIV hoje em dia. Carga viral indetectável significa que o vírus está tão baixo no organismo que os exames não conseguem detectá-lo. Isso acontece graças ao tratamento. “Quando a pessoa toma a medicação corretamente, ela impede que o vírus se replique. Com isso, protege seu sistema imunológico, reduz inflamações e ganha muita qualidade de vida”, detalha o infectologista Érico Arruda.

Além de cuidar da própria saúde, existe um benefício que mudou o rumo da história da doença: indetectável = intransmissível. “A ciência já comprovou: pessoas vivendo com HIV e com carga viral indetectável não transmitem o vírus para outras pessoas, nem em relações sexuais. Mas é importante manter o tratamento em dia e realizar os exames regularmente. Não basta ter uma única carga viral indetectável — é preciso continuidade”, ressalta o infectologista.

É importante manter o tratamento em dia e realizar os exames regularmente

Tomar minha medicação todos os dias. Esse é o meu maior ato de autocuidado. E viver, né? Ser feliz”, comenta João [nome fictício], pessoa que vive com HIV acompanhada no ambulatório do HSJ.

Outro avanço transformador diz respeito às mulheres que vivem com HIV. Hoje, com tratamento adequado e carga viral controlada, é possível que a gestação, o parto e o nascimento aconteçam sem transmissão do vírus para o bebê. “Quando garantimos que uma gestante que vive com HIV tenha carga viral indetectável, impedimos a replicação do vírus e evitamos a transmissão ao filho”, reforça o especialista.

Prevenção

Também é importante dizer que o ideal é sempre buscar a prevenção do HIV. O uso do preservativo — também conhecido como camisinha — durante as relações sexuais é a principal forma de se prevenir, protegendo não só contra o HIV, mas também contra outras infecções sexualmente transmissíveis.

Outras estratégias modernas e eficazes são a PrEP (profilaxia pré-exposição, recomendada para pessoas que já sabem que vão ter exposição de risco e querem se prevenir) e a PEP (profilaxia pós-exposição, indicada quando a exposição já aconteceu e você precisa tomar uma medida para evitar que aquela exposição resulte em infecção pelo vírus).

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Relação do HIV com outras doenças

Ter HIV não impede que a pessoa contraia outras infecções sexualmente transmissíveis, como sífilis, gonorreia ou hepatites virais. Isso está muito mais relacionado às práticas sexuais desprotegidas do que ao tratamento do HIV, daí a necessidade de utilizar a camisinha, explica o infectologista Érico Arruda.

Ele explica que existem, porém, doenças oportunistas que podem ser mais graves em quem tem HIV. “No caso da tuberculose, por exemplo, o risco de contrair é até 40 vezes maior”, informa. Mas esse risco diminui gradualmente conforme o tratamento fortalece o sistema imunológico. Além dela, outras doenças oportunistas que podem aparecer quando a imunidade está baixa são criptococose, histoplasmose, neurotoxoplasmose e alguns tipos de câncer. Por isso, iniciar o tratamento cedo é fundamental.

O maior desafio ainda é o preconceito

Se a medicina avançou, o estigma e preconceito infelizmente ainda persistem. Para Érico Arruda, esse é o ponto que mais afeta a qualidade de vida das pessoas que vivem com HIV hoje.“Do ponto de vista clínico, conseguimos reverter a infecção pelo HIV rapidamente com a terapia antirretroviral, que é gratuita e eficaz. Mas o preconceito ainda limita a vida dessas pessoas e pesa muito”, afirma.

Viver com HIV hoje não significa viver limitado. Com o tratamento adequado, é possível ter saúde, planos, projetos e longevidade. Para Credileuda, entender isso é fundamental para acolher, apoiar e garantir dignidade às pessoas que vivem com o vírus. “Somos pessoas com sentimentos, desejos e sonhos e não um vírus que o preconceito mata”, finaliza.