No trajeto do motorista do Hemoce Gildásio Costa, um sangue raro e outras bolsas de sangue estão a caminho para salvar vidas

10 de setembro de 2021 - 15:54 # # # # # #

Natássya Cybelle e Emmanuel Denizard - Ascom Hemoce - Texto
Helene Santos - Ascom Casa Civil - Fotos Elígia Cavalcante - Vídeo
Yuri Leonardo - Arte gráfica


Vínculo de Gildásio com o Hemoce começou há mais de 20 anos, quando realizou sua primeira doação. Há seis anos, ele é um dos motoristas do equipamento da Sesa que transportam os hemocomponentes para unidades de saúde

Ser doador de sangue é levar esperança para quem nem sequer conhece. Uma doação que não se espera nada em troca, mas que tem um valor imensurável: salvar vidas. Na rotina de Gildásio Costa, 41, a missão veio em dose dupla. Trabalhando como motorista do Centro de Hematologia e Hemoterapia do Ceará (Hemoce), ele é responsável por levar as bolsas de sangue doadas para as unidades de saúde de Fortaleza. Nas horas livres, também ajuda a salvar vidas como doador de sangue.

O vínculo de Gildásio com o Hemoce, equipamento da Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), começou há mais de 20 anos, quando ele realizou a primeira doação. “Foi na intenção de ajudar uma pessoa que estava precisando de transfusão e, dali em diante, fiz da doação um hábito, motivado por ajudar qualquer pessoa que esteja precisando”, afirma.

Alguns anos depois, Gildásio passou em um processo seletivo para a vaga de motorista do Hemoce e foi contratado pela instituição, onde está há seis anos. O profissional tornou-se um “colaboradoador” – termo utilizado internamente pelo Hemocentro para os funcionários que também são doadores. Dentre as atividades da função, ele ficou responsável por transportar o sangue que é doado nas unidades de coleta de Fortaleza até aos hospitais da capital cearense. Uma missão cheia de significados e compromisso. “Nunca imaginei que eu ia trabalhar aqui. Um dia, eu estava no Hemoce como doador e, agora, eu estou aqui do outro lado, conhecendo todo o processo, vendo como o trabalho do Hemoce é valioso. Confesso que hoje me sinto até mais feliz em doar, porque sei como funcionam todas as etapas. Eu valorizei ainda mais a doação”, conta.

Depois de doado, o sangue passa por várias etapas e setores até ser liberado para a distribuição, área que é responsável pela entrega do material aos motoristas. O transporte do hemocomponente segue protocolos rigorosos estabelecidos por portaria do Ministério da Saúde (MS) para garantir que as bolsas de sangue cheguem às unidades de saúde com total segurança. Ao receber as bolsas, o motorista preenche e assina duas vias da declaração de responsabilidade pelo transporte, onde ele insere seu nome de forma legível, a data e a hora que está recebendo as bolsas, além da temperatura, que deve estar de 1º C a 10º C, de acordo com a portaria. A caixa permanece lacrada com um termômetro de acompanhamento durante toda a viagem. Uma via fica na unidade hospitalar e a outra, volta para o Hemoce.

A função dos motoristas é transportar, de forma adequada, os hemocomponentes. Havendo alguma eventualidade ou problema durante o percurso, os profissionais devem informar imediatamente ao Hemoce para, assim, contornar a situação. Nas mãos, a responsabilidade de quem sabe que está carregando vida. “A gente sabe que ali tá levando uma esperança para uma pessoa. É um trabalho que eu considero muito bonito”, destaca Costa.

Sangue raro

Transportar esperança é tarefa que Gildásio faz com maestria. Seja como motorista ou na cadeira de coleta da doação. E se ele já tinha um compromisso firmado com a solidariedade, esse laço foi fortalecido há quase quatro anos. Ele descobriu que possui um tipo de sangue raro e que sua doação pode ser a única chance para quem está à espera de transfusão. Silva tem o tipo sanguíneo identificado como U negativo. Ele faz parte de um grupo seleto de pessoas que doam somente por convocação do Hemocentro para situações de emergência. A notícia foi recebida com surpresa e entusiasmo. “Quando eu fiquei sabendo, foi uma surpresa enorme e, no começo, eu fiquei sem entender nada, mas fiquei extremamente feliz por saber que a minha doação tinha ainda um componente especial, me senti privilegiado”, lembra. O Hemoce passou a identificar doadores com sangue raro há oito anos.

De acordo com a diretora de Hemoterapia do Hemoce, o tipo U negativo é extremamente raro. “Esse antígeno pertence ao grupo sanguíneo MNS e é um antígeno esperado em praticamente 100% da população. Pessoas que são U negativo podem desenvolver um anticorpo chamado anti-U que vai reagir com todos os doadores, com exceção dos doadores U negativo”, explica.

A especificidade faz com que pessoas de sangue raro doem somente por solicitação do Hemocentro para atender algum paciente que possui o tipo sanguíneo semelhante ao do doador. “A gente que gosta de doar com frequência quer doar direto. Às vezes, eu encontro a médica e brinco que já tô doido pra doar sangue, mas ela pede pra eu aguardar”.

A espera ocorre porque os hemocomponentes têm validade que pode variar de cinco até 42 dias. Como não há possibilidade de prever quando o sangue raro será utilizado, é necessário que a doação ocorra por solicitação. Outro motivo é que precisa existir um intervalo entre as doações. Os homens podem doar a cada dois meses, até quatro vezes ao ano, já as mulheres precisam de um tempo um pouco maior, sendo possível doar a cada três meses, até completar três vezes ao ano.

Mas Gildásio nem teve de esperar muito para ajudar quem mais precisa. Ele foi convocado pelo Hemoce em menos de quatro meses depois da descoberta do tipo raro de seu sangue. A bolsa foi enviada para atender um paciente em outro estado. “A sensação de ajudar alguém que depende mais do que nunca de você é, acima de tudo, gratificante, eu me sinto extremamente feliz e estou sempre à disposição para doar”, confirma.

De lá para cá, o doador já foi convocado cinco vezes. A última coleta atendeu um paciente no estado de Minas Gerais. Silva segue doando sangue, transportando material biológico que salva vida, exercendo a solidariedade e sendo fonte de exemplo e inspiração.

Banco de doadores raros do Hemoce

O Hemoce garante à população, há oito anos, o serviço especializado de identificação de pessoas com tipos sanguíneos raríssimos. Atualmente, o Banco de Sangue de Doadores Raros do Hemoce tem cerca de 200 doadores que apresentam diferentes tipos sanguíneos raros no mundo.

Cada vez que um voluntário doa sangue no Hemoce, as amostras coletadas são avaliadas pelo Laboratório de Imuno-Hematologia. O material colhido passa por um processo de análise e testes que incluem tipagem ABO e RH e pesquisa de anticorpos irregulares. “Durante as análises, ficamos atentos às células do sangue, se existem fenótipos raros e anticorpos irregulares. Ao longo dos oito anos de implantação do banco, conseguimos identificar que 200 doadores de sangue do Hemoce possuem tipos sanguíneos raros”, detalha Denise Brunetta, coordenadora do laboratório.

Toda a triagem imuno-hematológica do doador de sangue da hemorrede pública do Ceará é feita no laboratório especializado do Hemoce, em Fortaleza, utilizando equipamento de alta tecnologia.

O Hemoce já enviou 55 bolsas com fenótipos raros para outros estados e uma para Colômbia, sendo o primeiro hemocentro do Brasil a enviar uma bolsa de sangue para outro país.