Outubro Rosa e população trans: prevenção para todes

26 de outubro de 2020 - 17:15 # # # # # # #

Camille Soares - Ascom SPS - Texto
Arquivo Pessoal - Fotos

O preconceito contra pessoas LGBT ultrapassa a violência verbal e física, e subentendido nas entrelinhas, apaga existências e tira direitos. Neste Outubro Rosa, a Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos (SPS) conversou com uma mulher e um homem trans para entender quais as barreiras que ainda distanciam este público dos atendimentos de saúde e prevenção.

Yara Canta (26) é atriz, cantora e ativista pelos direitos das pessoas trans e negras. Integrante do Fórum Nacional de Travestis e Transexuais Negros e Negras (Fonatrans), ela iniciou seu processo de transição de gênero por conta própria e até hoje sente muito desconforto em consultas médicas. “Ser uma mulher trans é saber-se só. Existe uma solidão imensa em todo o processo e isso se aprofunda quando se é uma mulher trans e negra dentro de uma sociedade que transfóbica e racista. Muitas de nós, por constrangimento e vergonha, nos acostumamos a não ter acesso a saúde. Tenho muitas amigas que passaram por tromboses e outras sequelas por não ter um acompanhamento adequado”, explica Yara.

“A gente consegue suportar a dor física mais do que a psicológica. Não dá para continuar em um corpo que não nos representa, e assim nos lançamos em busca dessa transformação, mesmo sem um suporte adequado para que tenhamos segurança em todo o processo”, explica a ativista pelos direitos trans.

A titular da SPS, Socorro França, ressalta que este segmento enfrenta uma realidade muito dura, seja dentro de casa, na rua ou no consultório médico. “Há sempre uma barreira a ser ultrapassada para que pessoas LGBT tenham suas existências reconhecidas e nossa missão tem sido garantir que este segmento conheça e acesse seus direitos”, pontua. Ela destaca que, por meio da Coordenadoria de Políticas Públicas para LGBT, a SPS tem construído um diálogo junto a Secretaria da Saúde (Sesa), para que levar essa atenção mais inclusiva aos profissionais de saúde.

Para a articuladora técnica da Coordenadoria de Políticas Públicas para LGBT da (SPS), Lucivânia Sousa, a exclusão que atravessa os corpos trans e travestis é um sintoma de uma que não enxerga as subjetividades de quem não se encaixa nos padrões. “Por muitos anos as especificidades desses corpos e corpas estiveram ausentes nos diálogos sobre a importância da prevenção aos cânceres que acometem nós, pessoas trans. Desde o ano passado, quando iniciamos a campanha Ceará de Todxs, temos provocado essa discussão, haja vista que ainda é um tabu para a sociedade compreender, acolher e respeitar as particularidades do manejo em saúde desses sujeitos sociais”, explica Lucivânia.

De acordo com uma pesquisa realizada pela University Medical Center, em Amsterdã, mulheres trans têm cerca de 47 vezes mais chances de desenvolver câncer de mama do que os homens cisgênero (homens que se identificam com o gênero que lhes foi atribuído no nascimento), e mesmo assim, muitas não fazem os exames de prevenção, e os motivos estão sempre ligados ao desconforto e constrangimento nos atendimentos médicos.

O sociólogo Gabriel Pontes (25) é um homem trans e iniciou sua transição de gênero por conta própria. “Me “descobri homem trans no início de 2020, mas desde criança sempre me senti homem, e foi um longo processo até me reconhecer nessa identidade social”, conta o jovem, que integra a Associação Transmasculina do Ceará (Atransce). Gabriel iniciou seu processo mudando de nome, e depois começou a terapia hormonal com testosterona por conta própria. “Eu comecei sozinho nesse processo com os hormônios e isso é muito arriscado. Hoje a minha militância é para que outras pessoas trans tenham acesso às informações e entendam que é um direito ter acompanhamento médico humanizado”, pontua.

A falta de prevenção acaba dificultando a detecção de nódulos malignos, câncer de colo de útero, de próstata e muitas outras doenças que podem evoluir e levar o paciente a óbito. Em todos os casos, independentemente do gênero, a prevenção com acompanhamento médico, exames clínicos e o conhecimento do próprio corpo são essenciais para prevenir a doença.